Avenida dos Sonhos, 1988

Escritos cômicos e cósmicos...

sábado, agosto 23, 2008

Retrato da Consciência

Todos os pecados de um ser humano transparecem em sua face. É nítida a percepção de um homem para outro, quando se olham nos olhos e percebem o vazio de sentimento ou a abundância deste. As rugas de expressão são sinais do envelhecimento ou das seguidas tensões dos músculos faciais causadas pelas sensações diversas (alegria, tristeza, ódio, êxtase...) e são o retrato de uma vida, não importando o caminho que seguira.

Esses caminhos podem ser confusos e difíceis. O mais fácil, claro, é o errado, o mais gostoso, sórdido, que nos leva a regozijar e, em seguida, temer as conseqüências. Quando alguém mata uma pessoa não se espera que ela fique contente, saltitante pra lá e pra cá, mas sabe-se que a adrenalina que é liberada no exato momento do disparo de uma pistola é superior à mesma quantidade liberada num pulo de bungee jump. E quando a pessoa mata a outra com uma faca?

Desculpe, esse início sombrio serve apenas para ilustrar como o homem está sujeito, única e exclusivamente, às suas vontades, boas ou más. Desde cedo aprendemos o que é certo e errado, mas o referencial, muitas vezes, nos leva crer que nem sempre o que é certo é realmente certo. Desvio de conduta, falta de caráter, desinformação, ignorância, alguns dos motivos principais para haver hoje em dia tanta violência gratuita por aí. Tornou-se um esporte, uma forma simples e rápida de dar algum sentido em sua existência (mesmo que este seja o de tirar uma vida).

Mas e se alguém realmente não pudesse sentir as conseqüências? Não digo as conseqüências legais, que já são defasadas por natureza, mas as conseqüências idiossincráticas. E se a consciência não pesasse de forma alguma? Há casos que, por exemplo, um assassino não se arrepende de ter matado, mas com absoluta certeza, em seu interior, ele nunca mais será alguém tranqüilo, sem nenhuma preocupação em relação a esse tipo de coisa. Agora imagine, além de ter cometido uma atrocidade terrível, não sentir culpa, não se sentir errado de alguma forma?

É exatamente disso que O Retrato de Dorian Gray, do autor Oscar Wilde, trata, de um homem sem consciência. Ele a deixou trancada num quarto escuro para que nem mesmo ele a visse e se deparasse com o terror de seus atos. Seus amigos próximos começam a suspeitar quando o próprio Dorian cansa-se de uma vida inconseqüente, e é quando seu mundo começa a desmoronar a seus pés.

A austeridade de uma sociedade hipócrita como a Londres do fim do Século XIX torna tudo mais instigante, como crimes que hoje em dia nada significam, não possuem valor algum. Dorian sofre as conseqüências de seus atos, afinal, por tentar tomar para si, por escolha própria, toda a culpa que na verdade não sente, todo o remorso que permanece escondido e jamais seria libertado caso não houvesse intervenção.

A Dorian Gray foi dada uma dádiva que se transformou em maldição, mas apenas pela escolha de seus atos. É difícil descobrir se todas as maleficências por ele causadas ou diretamente interligadas ocorreriam se o quadro não existisse. Curioso perceber que no primeiro de seus seguidos atos de “má conduta” ele não tenha sentido remorso e no último deles, de bem menor importância, tenha sentido todo o peso acumulado de seus pecados. Conclui-se que, por pior que seja, é melhor deparar-se com os erros do que adiar o inevitável momento de confronto, pois a força do impacto será, com certeza, mais esmagadora que até então.

2 Comments:

Blogger Unknown said...

Legal esta tua página. Ainda não tinha tido oportunidade de ler, assim, com toda a atenção... percebo que a cada texto vc me surpreende um pouco mais (e isto não é muito natural, na minha idade, onde td é tão sem surpresas...)Escreva mais.

2:32 PM  
Blogger fernando said...

Dudu muito bom hein?!
Parabéns

F.H. da Elite

7:07 PM  

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